Washington pressiona aliados a banirem gigante chinesa da construção de redes 5G
RIO — O encontro nesta segunda-feira entre o presidente, Jair Bolsonaro, e o diretor executivo da Huawei Brasil, Wei Yao , tem como pano de fundo a disputa tecnológica entre Washington e Pequim , que se arrasta desde o ano passado e tem na gigante chinesa seu principal alvo. Maior fornecedora de equipamentos de redes de telecomunicações e segunda maior fabricante de smartphones do mundo, a Huawei se apresenta como uma das líderes para a próxima geração da telefonia móvel, mas é acusada pelo governo americano de facilitar a espionagem para a inteligência chinesa.
A emergência do 5G aumenta as preocupações americanas, e o governo do presidente, Donald Trump, pressiona aliados a banirem a fabricante chinesa de suas redes. Austrália e Nova Zelândia foram os primeiros a se alinharem com Washington, seguidos pelo Japão. Ponto. Aliados de primeira linha, como Canadá e Reino Unido — participantes do grupo chamado Five Eyes —, ainda avaliam se irão ou não ceder à pressão americana.
Quinto maior mercado de celulares do mundo, atrás apenas de China, Índia, EUA e Rússia, o Brasil entrou na disputa entre Washington e Pequim. No ano que vem, o país vai realizar o leilão das frequências que serão exploradas pelo 5G. A Huawei não quer ficar de fora, mas os EUA pressionam para que ela seja banida. Em agosto, o secretário de Comércio dos Estados Unidos, Wilbur Ross, revelou ter “alertado” o governo brasileiro sobre as “vulnerabilidades” da tecnologia chinesa.
Após a reunião com Wei, Bolsonaro se esquivou de perguntas sobre o 5G, dizendo apenas que o leilão vai considerar “oferta e conectividade”. A Huawei não participa diretamente dos leilões, mas fornece equipamentos para as operadoras, que disputam o espectro.
Suspeita é antiga
As suspeitas americanas sobre a Huawei não são novas. Um relatório do comitê de inteligência da Câmara dos Deputados dos EUA, de 2012, cita que Huawei e ZTE não conseguiram demonstrar que estavam “livres da influência de Estado estrangeiro (a China) e, portanto, representam uma ameaça de segurança aos EUA e seus sistemas”.
Desde então, agências de inteligência dos EUA alegam que a Huawei mantém relações com Pequim e que seus equipamentos possuem portas secretas para uso da espionagem chinesa. Contudo, em todo esse tempo nenhuma evidência foi apresentada e a empresa nega repetidamente a acusação. Mas a Lei de Inteligência Nacional, que entrou em vigor na China em 2017, determina que “qualquer organização ou cidadão deve apoiar, ajudar e cooperar com o trabalho da inteligência do Estado”, reforçando a suspeita.
Em dezembro do ano passado, Meng Wanzhou, diretora financeira e herdeira do fundador da Huawei, Ren Zhengfei, foi detida no Canadá a pedido dos EUA, onde é mantida em prisão domiciliar a espera de julgamento de pedido de extradição. Para o Departamento de Justiça americano, a executiva está envolvida em casos de lavagem de dinheiro, fraude bancária e roubo de segredos industriais, entre outas acusações. Os crimes teriam sido cometidos para burlar sanções comerciais impostas ao Irã.
Em maio os EUA deram o mais duro golpe na gigante chinesa. Alegando riscos para os interesses da política externa americana, o governo incluiu a Huawei numa lista de companhias proibidas de comprarem peças e componentes de fornecedores americanos. A medida continua em vigor, mas a empresa encontrou formas para driblar as sanções, seja com desenvolvimento interno — inclusive de um sistema operacional para substituir o Android — ou com a compra de fornecedores baseados nos EUA, mas com fábricas em outros países .
Quem é a Huawei?
A Huawei foi fundada em 1987 pelo ex-miliar Ren Zhengfei, como representante comercial de uma fabricante de sistemas PBX de distribuição telefônica (antecessores do PABX), e investe no desenvolvimento de produtos para telecomunicação em zonas rurais. Dez anos depois, começa a fornecer equipamentos para a telefonia móvel e embarca no boom chinês, se transformando na maior companhia privada daquele país.
No ano passado, a empresa faturou US$ 105 bilhões, sendo 51,6% na China, 28,4% na Europa, Oriente Médio e África, 11,4% na Ásia Pacífico e apenas 6,6% nas Américas. A divisão consumidor, que inclui o segmento de smartphones, respondeu por 48,4% das receitas da companhia, enquanto a divisão de equipamentos para operadoras gerou 40,8% do faturamento.
Mesmo com as sanções impostas por Washington, o faturamento da companhia continua crescendo. Segundo balanço divulgado mês passado, as receitas aumentaram 24,4% nos primeiros nove primeiros meses do ano, para 610,8 bilhões de yuans, ou US$ 86,2 bilhões.
No Brasil, a presença no mercado de smartphones ainda é tímida, com o retorno das vendas neste ano longa ausência, mas a companhia é uma das principais fornecedoras de equipamentos para operadoras de telecomunicações, com escritórios em São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Curitiba e Recife, além de um centro de pesquisas em internet das coisas em Sorocaba.